Podemos conjeturar
se a invasão da Ucrânia não será apenas o início de outros objetivos imperialistas
e mais ambiciosos de Putin, se conseguisse ocupar parte ou a totalidade da
Ucrânia. Por agora bastar-lhe-ia bloquear o acesso da Ucrânia ao Mar de Azov e
ao Mar Negro, caso consiga dominar toda a área que vai da Kharkiv a Odessa
passando por Zaporizhia, Kherson e Mikolaiv, o que, até à data, não foi
conseguido.
O caso da Crimeia,
república autónoma da Ucrânia, anexada pela Rússia em 2014, que gerou um
conflito na região que dura até hoje. A crise na Crimeia foi motivada pela
deposição do presidente ucraniano Viktor Ianukovitch, (que fugiu de seguida para
a Rússia), alinhado com as políticas russas de Putin que foi seguida de um
referendo fantoche que aprovou a sua união com a Rússia, não sendo, contudo, reconhecida
por Kiev nem pela comunidade internacional.
O ponto de
vista da preparação a de uma possível invasão da Europa em larga escala, planeada
a longo prazo, a começar pela Polónia através da Bielorrússia, estaria em linha
com o discurso do presidente Vladimir Putin antes da invasão da Ucrânia.
Não se sabe se,
atualmente, a Rússia terá ou não capacidade militar para lançar um ataque
contra a Polónia ou qualquer outro país da NATO, mas Putin tem ambições imperialistas,
de longo prazo, ele próprio não o nega, e
está a procurar, numa primeira fase territórios vizinhos e próximos das suas
fronteiras. É um processo contínuo a Rússia tentar invadir algumas das regiões
que ela reivindica, pela voz de Putin, como sendo suas.
Dias antes da
publicação deste “post” o presidente da
República Russa da Chechénia, Ramzan Kadyrov, sugeriu, numa entrevista na
televisão do estatal daquele país, que o exército russo invadisse a “Alemanha Oriental”,
como era chamado o território da antiga RDA (República Democrática Alemã) antes
da queda do império soviético. O motivo de tal ataque verbal teria a ver com a entrega
de tanques à Ucrânia, anunciada pela Alemanha. Também aquele radical terá sugerido
que a Rússia atacasse a Ucrânia com armas nucleares.
Mais descarada
ainda, e até ridícula, foi a afirmação do ministro dos negócios estrangeiros da
Rússia, Lavrov, numa conferência na India, (3 de março), quando lhe perguntaram
como é que a guerra afetou a estratégia energética da Rússia e como isso
poderia beneficiar a Rússia, Lavrov respondeu: “A guerra que estamos tentando
impedir foi lançada contra nós” o que suscitou gargalhada na plateia que pode
ver aqui
ou aqui. Este mesmo sujeito já afirmou
em fevereiro do corrente ano que a Rússia
deveria procurar "desnazificar" a Polónia, usando a mesma
linguagem e argumento que Putin usou para justificar a invasão da Ucrânia.
Tem-se escrito
e falado muito sobre a equiparação dos propósitos de Putin com os que Hitler para
começara a guerra: a expansão da Alemanha e a disseminação da política nazi; depois
de, no tempo da União Soviética de Estaline este ter feito um pacto em 23 de
agosto de 1939 com a Alemanha nazi de
Hitler, Putin diz agora querer combater o nazismo na Ucrânia. O governo de Hitler tinha em mente a criação
de um império vasto, um “espaço vital” como ele lhe chamava então conducente à expansão
germânica no leste europeu. Vladimir Putin tem a mesma ambição, mas para
ocidente para criação dum império, conforme as suas próprias palavras. A
efetivação da dominação russa sobre a Europa, como têm dito os seus
correligionários, requereria uma nova guerra. Como já várias vezes escrevi
neste mesmo local Putin nunca aceitou a dissolução da União Soviética e
descreveu o seu colapso como uma “grande tragédia do século XX".
Putin recorre a
uma narrativa sobre eventos passados para dar, no presente, um significado
especial que sirva para fortalecer a sua autoridade como detentor do poder e reavivar
no povo antigos mitos políticos do culto
de personalidade. É isto que Putin pretende criar um novo, mas retrogrado, um culto
à sua personalidade, de inspiração estalinista que remeta para uma forma de
propaganda que eleve a sua figura a político
de dimensões quase religiosas cujos discursos procurem promover, de forma
exagerada, os seus méritos e qualidades, fazendo ocultar críticas ou defeitos que
possam vir a ameaçar o seu poder e a condição de grande líder e guia da pátria
russa.
O presidente
Vladimir Putin, que muitas vezes invocou e
a história para alimentar sentimentos nacionalistas, comparou-se ao czar
Pedro, o imperador que expandiu o território russo através de conflitos
prolongados no século XVIII.
Logo após a invasão
da Ucrânia de fevereiro, no dia 9 de junho de 2022, num discurso do 350º
aniversário do nascimento de Pedro, Putin pareceu fazer uma ligação da sua
sangrenta invasão da Ucrânia com o passado imperial da Rússia. Segundo um
jornal russo “o presidente russo Vladimir Putin, durante uma reunião com jovens
empresários, engenheiros e cientistas na VDNKh em Moscovo, comparou a situação
atual na Ucrânia com a Guerra do Norte (1700-1721) com a Suécia, que foi
liderada por Pedro I”.
O
jornal MKRU escrevia na altura que “o presidente Vladimir Putin traçou analogias
com Pedro I. Segundo o presidente, “o imperador "não tirou nada"
dos suecos durante a Guerra do Norte, mas devolveu os territórios que
historicamente pertenciam à Rússia. E também coube à nossa parte retornar e
fortalecer". Confirmava assim que, no pano de fundo ideológico da “operação
especial” na Ucrânia, subsistia a ideia de reunir ao que ele chama mundo russo
e recriar a “Novorossiya”.
Putin elogiou a
construção do império de Pedro I e sugeriu que as terras tomadas pelo czar
pertenciam legitimamente à Rússia. "O que Pedro estava fazendo?" De
acordo com a Associated Press Putin disse na altura que o que Pedro fez foi
segundo ele "Retomar e reforçar. Foi o que ele fez. E parece que nos coube
também retomar e reforçar." Os comentários foram amplamente vistos como
uma referência ao ataque de Putin à Ucrânia, que há muito vê como parte da
esfera de influência da Rússia.
Em 24 de
fevereiro, Vladimir Putin chocou o mundo ao iniciar uma guerra com a invasão da
Ucrânia. No período que antecedeu a invasão russa, Putin fez discursos de longo
alcance e escreveu um artigo para legitimar as suas ações que estava repleto de
intensa retórica sobre a história imperial e a história soviética. No entanto,
isso não é algo novo. Putin tem consistentemente instrumentalizado a história
para alcançar os seus objetivos políticos desde o dia em que se tornou
presidente.
Ao longo dos
anos, tem-se referido cada vez mais, e repetidamente, à história do Império
Russo, como se pode verificar nos seus discursos. A história nas suas mãos tem-se
transformado gradualmente numa arma. Putin pratica essa retórica
dentro do país e para o exterior para justificar as suas ações, garantir a sua
posição de poder e a legitimação da invasão que foi sua e apenas sua, culminar
da sua estratégia. Por outro lado parece haver também, por parte de Putin, uma
espécie de saudosismo que reside numa espécie de esperança profética assente na
crença de que é possível um retorno ao antigo regime soviético numa versão
século XXI.
Putin parece
ter adaptado à atualidade a frase que Estaline escreveu em 1924 no seu livro “Foundations
of Leninism” onde afirmava que o
mundo estava dividido em dois campos hostis «a frente mundial do imperialismo»
e «a frente comum do movimento revolucionário em todos os países»; afirmava
ainda Estaline, de modo particular, que «na presente fase do capitalismo as
guerras não se podem evitar». Na linha interpretativa de Putin o mundo continua
dividido em dois campos, o ocidente e a NATO que fazem parte da maquinação do campo
hostil e invasor da Rússia, e o dele, pacifista, defensivo. Mas é ele que
mostra uma agressividade bélica, expansionista, no sentido de regressar ao anterior
império czarista. É o pensamento dos totalitaristas.
A solução
adotada pelos ditadores totalitários é dirigir a hostilidade latente do povo contra
inimigos reais ou imaginários. É este último caso o de Putin contra a Ucrânia e
o Ocidente. Hitler escolheu primeiro os judeus para alvo da agressividade alemã;
uma vez arranjado um alvo não ficou satisfeitos e, mais tarde, outros povos e
personalidades tomaram o lugar dos judeus. No caso de Putin parece ser o povo
ucraniano e, segundo ele, um produtor de fake news, passa para o povo
russo a ideia de que os invasores são o ocidente e a NATO que estão a cercar e a invadir a
Rússia.
A Rússia é um
país localizado na Europa e na Ásia com os montes Urais frequentemente vistos
como a fronteira entre os dois continentes e é amplamente considerado política
e culturalmente europeu. Segundo as estatísticas mais recentes, em janeiro de
2023, tem aproximadamente três quartos da população que vive a oeste dos montes
Urais, na Europa portanto, geograficamente fronteira entre os dois continentes.
Se observarmos
o mapa seguinte que nos mostra as atuais fronteiras da Rússia comparadas com as
de 1914 podemos supor até onde poderá ir o sonho imperial de Putin, que tenta
comparar-se ao czar Pedro, com uma ideologia irracionalista, pretensamente mítica
que mostra uma colocação política irracional tendente a voltar a consolidar as suas posições em
direção ao sul e leste do país.
Putin parece não se ter desligado,
nem esquecido do mundo russo soviético em que viveu e em que participou que implodiu
em dezembro de 1991. Entre 1922 e 1991 a ex-URSS era formada por 15 nações
diferentes: Rússia, Ucrânia, Bielorrússia, Estónia, Letónia, Lituânia, Arménia,
Geórgia, Moldávia, Azerbaijão, Cazaquistão, Tajiquistão, Quirguistão, Turquemenistão,
Uzbequistão. Sob o domínio de Estaline e durante a Segunda Guerra a URSS combateu
ao lado dos Países Aliados, e fez da Alemanha o seu principal alvo militar.
Nesse contexto, o Exército da URSS invadiu a Alemanha e os territórios sob a sua
zona de influência e formou estados-satélite como a República Popular da Polónia,
República Popular da Hungria, República Popular da Roménia, República Popular
da Bulgária, República Popular da Albânia, República Socialista da Checoslováquia
(atualmente República Checa e Eslovénia) e, no fim do conflito, a parte leste
da Alemanha que passou a ser denominada por República Democrática Alemã.
Questiono-me
várias vezes porque será que andam nas redes sociais muitos “personagens” a
divulgar propaganda do Kremelin/Putin difundindo notícias falsas anti Ucrânia em
sintonia com as mesmas que Vladimir Putin e os seus seguidores russos fazem em sucessivas
lavagens cerebrais ao povo. A estes que, aqui, em liberdade, defendem as ideias
de Putin pergunto porque não vão viver para esse extraordinário país sob o seu
domínio e deixam de viver cá onde recebem salários à custa dos impostos que
todos pagamos? É a liberdade de expressão a funcionar dirão, mas será que nesse
regime que tanto defendem não haverá a mesma liberdade para dizerem o que
pensam por maioria de razão?