Política

A virtude da direita passou a estar no centro-direita

A direita PSD e CDS não querem ser de direita, negam que haja qualquer ideologia nas suas opções e colocam-se ambos no centro-direita do leque partidário. Alguns teóricos e militantes do PSD já o fizeram, coube agora a vez do CDS-PP.


A ideologia é um sistema de ideias, valores e princípios que definem uma determinada visão política do mundo, fundamentando e orientando a forma de agir de uma pessoa ou de um grupo social, seja partido ou movimento político, seja grupo religioso ou quaisquer outros.


O princípio que orienta certa direita portuguesa, segundo a voz de alguns dos seus militantes e apoiantes, é que atualmente a ideologia está fora de questão na governação não interessa dentro do partido. Não se pensa em termos ideológicos, mas em termos de realizações e de práticas. Como se, em política, a pragmática estivesse afastada da ideologia! Por mais que neguem existe ideologia de direita assim como há a da esquerda, do centro, seja qual for o arrumo político.


Parece-me ser isto uma iliteracia cultural, muito comum nas últimas décadas no meio de certas juventudes partidárias de direita ou em políticos delas oriundos, para além de ser também uma aberração intelectual que vai até contra o senso-comum. A ideologia é intemporal, sempre existiu e não há o exercício da política sem ideologia. As religiões têm as suas específicas ideologias de ordem teológica.


Todavia, para a direita, interessa que este tipo de mensagem passe. Há uma estratégia que vai no sentido de evitar o pensamento e a reflexão ideológicos para afastar qualquer comparação entre os conteúdos programáticos ou medidas políticas tomadas pelos partidos que não sejam apenas "pragmática".


Fazer política sem uma base ideológica baseada apenas no pragmatismo que desemboque numa espécie de era pós-ideológica parece-me impossível. A prática e o exercício da política são direcionados para as pessoas e para as nações e afetam as suas vivências sociais e pessoais que, por si só, têm já uma carga socioideológica devido a diferentes visões do mundo. A negação da ideologia não é mais do que uma inadequação desta atitude às necessidades sociais pela prática política.


A atual negação da ideologia pelos partidos de direita relaciona-se com um preconceito porque era um conceito considerado marxista no século XIX. Este preconceito é devido à ignorância cultural dos jovens políticos de direita e está fora do racional porque tudo o que falamos, pensamos e fazemos está marcado por um conjunto de ideias produzidas ou não por cada um de nós. Ainda que sejamos meros reprodutores de reflexões alheias, ainda aí, no âmbito do senso comum, está presente um conjunto de pensamentos que tomamos por verdades especialmente em política.


A negação da ideologia pelos partidos de direita não é mais do que uma pressuposta imposição hegemónica dum outro tipo de ideologia, não manifesta e insidiosa, porque não oculta, como única forma de pensamento possível e de valores tomados como absolutos que parte de um imutável senso-comum. É uma não-ideologia mistificada pela lógica da estabilidade política associada a uma democracia sem densidade onde dominaria o poder financeiro. Sabemos bem onde esta falta de ideologia nos poderá levar.


Assim, a direita ao mesmo tempo que pretende desvalorizar o conceito e se identifica politicamente com a área liberal está, por inclusão, a defender uma ideologia, a sua. A ideologia está em toda a parte, não vale a pena escondê-la porque mais tarde ou mais cedos ela revela-se.


Antes do congresso do congresso do PSD em novembro de 2017 discutiam-se opções ideológicas do partido e Santana Lopes falou em "liberalismo" e procurou fugir aos rótulos ideológicos. Pediu um partido que respeitasse a sua "identidade" e o seu "programa", mas, sobretudo, "próximo das pessoas", (confira-se com a posição de Assunção Cristas na sua moção ao congresso do CDS), houve até quem afirmasse que "O PSD é um partido catch-all. Tem vários setores".


O CDS está a preparar o congresso para março e também, à semelhança do PSD, o CDS pretende esconder a ideologia da sua matriz inicial e substituí-la por outra o exemplo é a moção de estratégia de Assunção Cristas ao próximo congresso que situa o CDS-PP como um partido do centro-direita omitindo a sua matriz democrata-cristã.


Também a questão ideológica é rejeitada por Assunção Cristas apesar de constar na moção da líder recandidata que contrasta com outras moções globais e rejeita a acusação e assume a opção de não carregar a moção com ideologia e a preferência pelo pragmatismo argumentando que essa explicitação doutrinária já consta da sua moção ao congresso de 2016. Mas no partido há quem assuma a posição ideológica e defenda como Lino Ramos, ex-secretário-geral, que defende que "este é seguramente o momento de afirmar o CDS, de regressar às suas origens e de afirmar a democracia-cristã". Está então aqui a assunção ideológica essencial para as políticas que defende.


A direita PSD e CDS vêm de momento desvantagem assumirem-se como partidos de direita querendo mostrar-se ao eleitorado como sendo de centro-direita. A moção de estratégia global de Assunção Cristas ao congresso coloca o CDS-PP como uma força de "centro-direita", mas é omissa quanto à matriz democrata-cristã do partido. Isto é, nega que haja uma questão ideológica e, ao mesmo tempo, pretende redirecionar o partido no sentido do centro-direita. Mas afinal o que é isto senão uma tomada de posição ideológica.


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Procura-se troika, dão-se alvíssaras a quem a encontrar

Quem se dedicar a estabelecer comparações entre a governação no tempo da troika e a atual no que se refere a notícias, opiniões, comentários e outros escritos jornalísticos sobre as diversas áreas do país encontrará de certo diferenças que vão desde a saúde à educação, da proteção civil (e os incêndios) à segurança e o assalto a Tancos, da falta de investimento público à progressão nas carreiras na função pública, das reivindicações salariais à inserção imediata dos precários nos quadros, dos pedidos para tudo e mais nalguma coisa. Enfim, de norte a sul, dos hospitais às escolas, da justiça às funções de soberania aos incêndios verificará que há todo um manancial reivindicativo e de falhas atribuídas à governação, mesmo que não sejam das suas atribuições. Como nada é feito nem dada satisfação imediata às reivindicações que surgem dos mais diversos setores Sónia Sapage, no artigo de opinião do jornal Público, vem dizer que tudo está como se o país tivesse "a troika cá dentro". Está no exercício do seu direito de livre expressão de pensamento.


No artigo de opinião a jornalista percorre o caminho da crítica à governação e esquece (ou será que omite?) tudo o que a atual governação tem feito e centra-se exclusivamente sobre o que continua por fazer ou que, eventualmente, corre mal. Recorre então à grande tirada de Passos Coelho e à sua propaganda da "saída limpa" do chamado Programa de Assistência Económica e Financeira, afirmando que "há quase quatro anos (mais do que aqueles que durou o ajustamento)" e Sónia Sapage acrescenta que "ainda há muita troika por aí".


Apesar de sabermos que há, com certeza, falhas e atrasos na tomada de medidas, também não é difícil deduzir que, quem assim argumenta tem uma posição passadista que gostaria de ver continuada e que, por certo, se estivéssemos ainda nesse passado omitiria para os mesmos casos o que agora critica. Acredito que não é o caso de Sónia, mas há, na verdade, um certo jornalismo do tipo sick news, jornalismo doentiamente e dissimuladamente partidarizado que ajuda a avivar a "pequena" chama da oposição através de casos e casinhos tirados daqui e dali. Façamos neste caso justiça, muito do que a Sónia refere, infelizmente, não pertencem a este rol. Um artigo de opinião sobre política é formatado de acordo com os pontos de vista do seu autor(a) e por isso pertence, quase sempre, ao leque da subjetividade e da parcialidade.


Há muita coisa para fazer e para corrigir cuja maior parte ainda é herança do tal governo da saída limpa que foi demonstrada pelo estado em que deixou o país com o Banif, a CGD, os lesados do BES, a justiça, o SNS e o que mais fora. A oposição de direita quer fazer-nos crer que está a ser destruído pelo atual governo quando foi ela, de facto, o motor de arranque da destruição de tudo ou quase tudo quando esteve no poder justificado durante mais de quatro anos pelo "ir para além da troika". E o que fizeram os partidos PSD e CDS que então estavam no governo que merecesse relevância positiva para o país e para as pessoas após a dita saída limpa? Alguém se recorda?


Certo jornalismo pretende, conscientemente, induzir o esquecimento do passado da governação de direita de modo a transferir para o atual governo as mazelas deixadas em vários setores da sociedade que agora querem que sejam resolvidas em pouco mais de dois anos. Foram vários setores de funcionamento do Estado afetados por cortes, como as polícias e a consequente segurança, a justiça com encerramento indiscriminado de tribunais, os quartéis, as forças armadas, os hospitais e os centros de saúde com redução dos efetivos, quer de médicos, quer de enfermeiros com o cancelamento de novas admissões, e a educação prejudicada pela não admissão de profissionais de apoio às escolas, e o bloqueio do investimento público, etc., etc. fecho de serviços públicos com o pretexto do emagrecimento do Estado e da luta contra o despesismo.


O que vemos hoje são críticas lançadas para a opinião pública sobre a lentidão e o retardar de medidas nos referidos setores, greves reivindicativas para reposição de direitos, dos salários e das pensões, descongelamento das progressões nas carreiras com retroativos de imediato. Muitas daquelas medidas lesivas foram levadas a efeito pelo anterior governo, umas tomadas por necessidades conjunturais e transitórias que se tornariam definitivas, outras, justificadas pela necessidade de reformas estruturais ditadas pela troika, diziam. Não vimos nessa altura os que agora defendem o aumento da despesa e que se dê resposta imediata a tudo e a todas as necessidades que ainda são muitas.


Olha-se para tudo o que falta fazer e que em tempo não se fez e pretende-se que sejam de imediato satisfeitas todas as exigências. Já não interessa que venha aí o diabo e aumente a e faça disparar a despesa do Estado e que faça novamente aumentar o défice para haver argumentos baseados no "nós bem avisámos".


A oposição de direita argumenta que esta fase de crescimento da economia não se manterá para sempre e que estamos a negligenciar um possível futuro de menor crescimento da economia. Sem dúvida que todos concordamos com esta posição, todavia a direita tem de nos dizer em que ficamos. Se, por um lado, diz que não há investimento público, quando o negligenciou, que reclama sobre a falta de pessoal e a falta de qualidade de serviços públicos, que ela limitou, e exige que tudo seja cumprido de imediato, mostra esquecer-se de que sol na eira e chuva no nabal (que tanta falta nos tem feito) é que não é possível.


A direita poderá reivindicar que salvou o país da dita banca rota e que fez uma saída limpa do programa de ajustamento. Mas, se continuasse a governar, teria de facto livrado o país da troika ou teria agravado a situação com soluções e medidas que eram uma espécie de clones da troika e que iriam ainda mais além.


Há muita troika por aí, diz Sónia Sapage, contudo, podemos perguntar-lhe o que considera que a direita teria feito se estivesse no poder? Poderá ser uma resposta de retórica, mas, mesmo assim gostaríamos de saber.

As lições de Ressabiado Silva

O nome próprio “Ressabiado” não existe, é ficcionado. Tal nome próprio nunca terá sido posto a ninguém, a não ser como alcunha. Já viram com...