Política

Bem-dita troika que nos abrigaste nos teus braços dez anos depois

 


O pedido de ajuda internacional a Portugal que há dez ano deu lugar à intervenção da” troika” foi recordado através de vários artigos publicados na imprensa na primeira semana de abril (em 6 de abril 2021).

Para a direita, na altura no poder com a coligação PSD/CDS, a vinda foi abençoada pois seria essa a oportunidade de pôr em prática o plano neoliberal do PSD e do CDS porque facilitava a aplicação do projeto neoliberal de Passos Coelho e dos seus capangas que há muito traziam na manga. Para outros que não os desse lado, foi a tormenta que lhes abalou o bolso e a dignidade, para outros ainda foram o PS e José Sócrates os grandes causadores que trouxeram a “troika” a Portugal com os aplausos da direita pois era a oportunidade que lhes faltava.

Sobre aquele tempo de má memória escrevem-se agora várias narrativas. Apenas tive oportunidade de ler alguns artigos a que me irei referir.

Comecemos por Paulo Rangel, o reviravoltas de opiniões consoante lhe dita o seu interesse. Colocando de lado a argumentação e as suas retóricas constitucionalistas a que se refere num artigo vamos de facto ao que interessa.

O que Rangel defende é a constitucionalidade da aprovação no parlamento dos apoios sociais por uma maioria negativa entre a direita e parte da esquerda a qual gerou polémica por ser contrária aos pontos de vista do Primeiro-Ministro que contrariou o do Presidente da República. O que se estranha é que a direita, juntamente com a esquerda mais radical, tenha aprovado apoios sociais quando ela, a direita, por princípio, está sempre contra este tipo de apoios.

Rangel acusa o primeiro-ministro António Costa de ter políticas calvinistas, isto é, de não abrir os cordões à bolsa para pagar apoios sociais. Há um apagão de memória assumido por parte de quem, no passado, apoiava medidas e políticas calvinistas em questões de apoios sociais e cortes em salários e pensões. Sem qualquer pudor, aquele douto jurista / advogado / deputado europeu do PSD/ antigo apoiante incondicional de Passos Coelho / agora apoiante incondicional de Rui Rio, vem defender, legitimar e enaltecer a coligação negativa, situação que ele acha absolutamente defensável.

Leia-se o que ele escreveu com a epígrafe “Apoios sociais: o “calvinismo constitucional” de Costa”: “O que não se afigura normal e provocou este pico de tensão política é a dramatização que encenou o primeiro-ministro, focada no ataque ao Presidente Marcelo. É, por isso, muito infeliz e claramente enviesado o uso e abuso da expressão “coligação negativa”. No caso dos apoios sociais, ela é até uma coligação “pela positiva”, já que não rejeita ou impede nada.

É a justificação do injustificável com a cuspidela de víbora acicatando as relações institucionais, mas daquele senhor tudo se espera até inverosímil.

Façamos agora uma retrospetiva do que também foi escrito e dito pela imprensa na efeméride da troika. Há para todos os gostos.

Teixeira do Santos, para mim um dos responsáveis da vinda da troika afirmou que "Portugal, de 2011 até agora, foi consistente e mostrou rigor nas contas públicas" e que "Os mercados já não olharão para nós como há 10 anos".

Outros escreveram que “Portugal continua a apresentar debilidades estruturais que o deixam à mercê da irracionalidade dos mercados ou de uma mudança de política monetária”.

“Portugal pediu ajuda internacional há precisamente dez anos. Numa década, o país aplicou medidas de austeridade e tentou livrar-se delas a seguir. Mas há marcas da troika que ficaram”.

Com o título de Troika: “Isto é só um intervalo” escreveu-se que “Portugal continua a apresentar debilidades estruturais que o deixam à mercê da irracionalidade dos mercados ou de uma mudança de política monetária”.

“Há dez anos, o Governo socialista pedia ajuda financeira externa, mas o programa foi aplicado pela coligação PSD/CDS. Decisões impopulares como aumentos de impostos ou a redução da TSU deixaram marcas no centro-direita”.

“Deixar o país condicionado à receita preferida das entidades financiadoras é um atestado de menoridade à nossa soberania democrática. Apesar de todas as divergências que nos separam, temos de ser nós a arrumar a casa. Sob pena de outros o fazerem por nós”.

Quem o lado liberal defende escreveu com o título “Criatividade política e rebaldaria orçamental” que “Em termos constitucionais, sim, é a oficialização da rebaldaria orçamental – só que essa rebaldaria já existe, em termos políticos, desde 2015. É por isso que o presidente está errado, estando, ao mesmo tempo, certo”. Claro que sabemos a quem o articulista se refere ao referir desde 2015.

E assim se comemorou a vinda da troika que José Sócrates, com o beneplácito do então ministro das finanças Teixeira dos Santos, proporcionou para vanglória da direita.

 


Atirar aos juízes como alvos pode tornar-se num desporto

 

Raramente tenho escrito sobre o caso José Sócrates e a Operação Marquês porque as opiniões sobre factos complexos da competência da justiça só devem ser dadas quando se tem pleno conhecimento das causas e dos factos. Este não é caso. Quem estiver disposto pode pesquisar neste blog onde me refiro a José Sócrates. 

O tiro à justiça apenas interessa aos populistas de extrema-direita que dizem não serem do sistema, que estão contra o sistema, mas que dele lá se vão alimentando e vê-se que tem dado alguns frutos.

 Embora com algumas cautelas, não tenho dúvidas de que José Sócrates e outros terão sido intervenientes ativos em movimentos de corrupção. A isto acrescento a má governação e os desmandos feitos com os dinheiros públicos com o beneplácito do então seu ministro das finanças Teixeira dos Santos que se manteve na função apesar de posteriormente ter justificado que teria avisado o primeiro-ministro da situação financeira do país. Pode ser, mas manteve-se até ao fim conivente com a situação.

Apesar da minha convicção não me posiciono num ponto de vista de instrumentalização política de caso judicial ou do sistema judicial através de um justicialismo veiculado pela opinião publicada e pelas opiniões de rua.

A pronúncia do juiz Ivo Rosa sobre a Operação Marquês veio animar a comunicação social que andava há mais de um ano a mastigar arrastadamente a covid-19 e a vacinação. Finalmente algo de novo e já esperado aconteceu, logo opiniões divergentes, ávidas por clamação, vieram para a cena pública.

Desde que o juiz Ivo Rosa tomou conta do processo, e por desde logo não se terem verificado fugas de informação, as emoções, entretanto forçadamente contidas, ressurgiram e ficaram ao rubro ofuscando a racionalidade que foi subjugada pelos desejos de vinganças contidos e não satisfeitos, fomentados por alguma imprensa que esperou pelo grande momento que confirmasse na integra as suas suposições e indícios, mas que, afinal, lhes criou alguma frustração. Aliás não seria de esperar outra coisa dado uma fase de instrução que se transformou numa inadmissível mimetização do julgamento, que passou a ser uma repetição de algo passado antes do 25 de abril.

Surgem agora os justiceiros, incentivados pela comunicação social ao longo do tempo, que veem a justiça como algo que deva cair na rua para julgamentos populares emocionalmente fabricados. Estes não pretendem uma “justiça justa”, pretendem uma revanche por factos que não são mais do que indícios e não terão sido confirmados, nem comprovados com matéria de prova. Durante meses a fio fizeram-nos acreditar na fidedignidade do que, afinal, dificilmente poderia ser comprovada.

Li em tempos, não me recordo onde, das dificuldades de obtenção de prova nos crimes de corrupção passiva e ativa. A justificação era dada pelo caráter oculto e indireto com que estes tipos de crimes são praticados, dada a sua prática em locais acessíveis apenas aos próprios agentes da corrupção e ao recurso a várias pessoas o que faz diluir a relação entre o corruptor e o corrompido. As vantagens pedidas e acordadas numa tendencial comunhão de interesses, faz com que as verdadeiras intenções dos agentes sejam dissimuladas, dificultando a prova do seu real e efetivo significado. Se há dificuldades na obtenção de prova a recolha dos indícios suficientes da prática dos crimes de corrupção passiva e ativa, não passam apenas de indícios. E pareceu-me ser aqui que Ivo Rosa se baseou.

Todavia, por pesquisas que efetuei importará aos juízes acautelarem as situações de eventual arbitrariedade no proferimento de sentenças, (este caso ainda não se tratou de uma sentença), nomeadamente, por via de um maior preciosismo e rigor no cumprimento da obrigação legal de fundamentação está prevista no artigo 374.º, 2 do CPP que concretiza:

“1 - A sentença começa por um relatório, que contém:

a) As indicações tendentes à identificação do arguido;

b) As indicações tendentes à identificação do assistente e das partes civis;

c) A indicação do crime ou dos crimes imputados ao arguido, segundo a acusação, ou pronúncia, se a tiver havido;

d) A indicação sumária das conclusões contidas na contestação, se tiver sido apresentada.

2 - Ao relatório segue-se a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.

Então, a pronúncia da decisão instrutória da Operação Marquês segundo o Juiz Ivo Rosa parece estar aqui contida neste artigo.

Não sendo conhecedor dos aspetos jurídico, contudo, fico perplexo, talvez por ignorância da minha, no que subsiste nos que consideram não terem sido aceites os três crimes de fraude fiscal, de que José Sócrates estava acusado, porque o juiz considerou “inexiste qualquer norma legal no nosso ordenamento jurídico que imponha a um cidadão a obrigação de declarar, em sede de IRS, os proventos obtidos com o cometimento de um crime”, e neste caso houve opiniões contraditórias e algumas que consideraram de imediato tratar-se de “um erro”.

Sobre direito sou de fracos conhecimentos, como já afirmei anteriormente, parece-me um pouco ridículo que alguém que obtenha proventos por cometimento de um crime tenha que os declarar em sede de IRS. Se eu receber proventos de alguém que me corrompeu será que de corrida vou declarar esse valor para impostos!? Se, de facto, for provado que eu recebi esses proventos, então sim, eles devem ser sujeitos a imposto.

O que nos diz Rui Tavares no jornal Público é que:

“Mas aí entra o segundo elemento explicativo no texto de Sócrates à Folha [olha de São Paulo, Brasil] a referência repetida de que tudo isto se destinava a impedir uma candidatura sua à presidência. Um mero detalhe, mas curioso no sentido em que José Sócrates sempre se defendeu neste caso dizendo que as somas avultadas que recebia constantemente de um empresário eram apenas empréstimos e que a forma inusitada como as recebia (em “dinheiro vivo”, através de portadores, etc.) diziam apenas respeito à esfera da sua vida privada a que tinha direito como cidadão privado que já tinha abandonado a política. Ora, afinal o que José Sócrates nos diz (agora) é que estava apenas em pausa na sua atividade política, e ele próprio deve saber que viver assim à conta de um empresário o colocaria numa inaceitável posição de dependência como putativo Presidente da República”.

Quem está a tirar dividendos com isto tudo parece que é o Chega e André Ventura que estão a surfar à custa dos que se indignam com a justiça.


Navegando à bolina na política – à procura de melhores ventos

 

Também pode ler este artigo em https://apropositodetudo.blogs.sapo.pt/navegando-a-bolina-na-politica-a-269262

Navegar à bolina é navegar ora numa ora noutra direção, obliquamente em relação à linha do vento, de forma que o deslocamento resultante coincida com o rumo pretendido. Faz parte da arte de velejar. Por que caminho é que seguimos? Será que sabemos para onde vamos? O vento está de feição? Para se chegar a bom porto é preciso saber para onde os ventos nos levam.

Os partidos, organizam-se, reorganizam-se, reconstroem-se, mudam-se, contradizem-se, puxam pela criatividade, imaginam o inimaginável, quando sentem os ventos eleitorais a aproximarem-se. Esperam e aproveitam oportunidades para navegar à bolina, numa e noutra direção, de forma que o resultado coincida com o rumo/objetivo pretendido: a obtenção de mais votos. A corrida para a conquista de presidências e de maiorias para as câmaras já começou e a direita está na linha de frente das nomeações.

Com a preparação das candidaturas e das campanhas para as eleições autárquicas, especialmente na direita PSD, vemos que o candidato deste partido está a orientar as suas escolhas para a sua campanha em figuras que emergiram nas televisões durante a pandemia com análises sobre a evolução pandémica covid-19 e as medidas a tomar.

Vejam-se o caso do PSD com Carlos Moedas, cabeça de lista da coligação PSD/CDS-PP à Câmara de Lisboa, que escolheu para seu diretor de campanha o médico de Saúde Pública e epidemiologista Ricardo Mexia que tem tido visibilidade nos ecrãs de televisão como comentador durante a pandemia. Ricardo Mexia é desde 2016 Presidente da Associação Nacional dos Médicos de Saúde Pública e integra o Departamento de Epidemiologia do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge.

Apesar de Carlos Moedas parecer uma boa escolha para o PSD fica perante uma tentativa de uma coligação forçada que é de necessidade de facto não foi uma boa aposta visto que o candidato do PSD/CDS Carlos Moedas tem a marca do contributo que deixou no Governo de Passos Coelho de coligação PSD/CDS onde a lei das rendas foi e a privatização da Carris deixou marcas nas populações.

O candidato do PSD promete apresentar “um plano que prepare Lisboa para futuras pandemias e avança que o documento será elaborado pelo virologista Pedro Simas”, outro elemento que surgiu nos ecrãs duramente a pandemia. Veja-se como a candidatura de moedas parece ficar adulterada aos ser uma candidatura que se baseia na pandemia. Parece que a ciência está a começar a ser infetada pelo partidarismo e pela ideologia.

A isto Moedas ainda acrescenta o futebol: “Podemos ter uma cidade na liga de campeões da Europa”. Prevê-se que pandemia covid-19 e futebol serão apenas os dois grandes trunfos de Carlos Moedas.

No que se refere à extrema-direita o Chega foi procurar no catálogo de cromos dos tempos idos de apresentadores de programas de entretenimento e humor me canais de televisão Nuno Graciano que enveredou, há cerca de cinco anos, pela vida de empresário, com uma marca de queijo regional.

Em março de 2021 Graciano disse: “Fui presidente da associação de estudantes do meu liceu, fui presidente da associação académica da Universidade. Portanto, sempre estive ligado à política.” Segundo Fact  Check do jornal online Observador a frase é errada. E mais, afirmou esta terça-feira que "é cedo" para falar sobre o projeto político para o concelho, mas defendeu que a cidade tem "vários problemas muito graves" e precisa de um "abanão". Mas então, é cedo fazer um projeto, mas é rápido para ver problemas muito graves para a cidade? Que espécie de charlatão está aqui representado?

 A esquerda e a direita preocupam-se a procurar fragilidades nas embarcações dos adversários para se abalroarem. É uma competição onde vale tudo. Uma espécie de wrestling de veleiros. A esquerda procura a descobrir fragilidades nos candidatos da direita. Não terá sido por coincidência que Carlos Moedas, antigo secretário de Estado adjunto do primeiro-ministro do governo de Passos Coelho, vai ser ouvido a pedido do PS na comissão de inquérito do Novo Banco na terça-feira. Na segunda-feira, o debate do requerimento do PS para ouvir o antigo secretário de Estado do governo PSD/CDS-PP e agora candidato à Câmara de Lisboa foi marcado pela troca de argumentos e acusações, sobretudo entre sociais-democratas e socialistas. A audição de Carlos Moedas -- marcada para terça-feira, às 9.30 horas - é uma das três audições desta comissão de inquérito. Surge em cobertura de Carlos Moedas a ministra das finanças e Passo Coelho, Maria Luís Albuquerque a fazer de escudo a Moedas no inquérito ao Novo Banco.

Não importa a forma como se consiga. Com estas velas navegam também no permeio das declarações, decisões, contradições que apanham aqui e ali os senhores das opiniões publicadas e os comentadores das políticas do tipo pítia com guiões de novelas do tipo mexicano, mais ou menos enredadas, que se vão enrolando ou desenrolando consoante o final de gostariam que acontecesse. Lá vão aproveitando o rumo dos ventos com determinação. Uns, para alcançarem o poder, outros para ajudarem aqueles outros a alcançá-lo.


As lições de Ressabiado Silva

O nome próprio “Ressabiado” não existe, é ficcionado. Tal nome próprio nunca terá sido posto a ninguém, a não ser como alcunha. Já viram com...