Política

O modo de navegação reivindicativo e o proveito da direita

Nas duas últimas semanas nos órgãos de comunicação têm dado relevo a protestos reivindicativos vindo de vários quadrantes profissionais: são os da função pública, da Fenprof, da ASAE, da administração local, da PSP, enfermeiros, etc. Os enfermeiros ávidos por regalias e estatuto esperam para ver. Uns manobrados pelo PCP outros por fações sindicalistas afetos ao PSD.


A minha memória leva-me ao passado recente do governo PSD/CDS quando foram cortados a estas mesmas classes profissionais salários, direitos e regalias e, salvo uma ou outra agitação infrutífera incitada pela esquerda remetiam-se para seu cantinho sem resultados práticos a não ser o protesto com significado político.


Passos Coelho conseguia impor-se pela manipulação das emoções populares através da ameaça e do medo. Ao mesmo tempo demonstrava que a responsabilidade da austeridade era imposta pela troica, o que posteriormente se verificou não ser totalmente verdade. Os que agora vêm para as ruas calavam-se então. Estranho o facto dos movimentos reivindicativos estejam agora centrados neste Governo que tem vindo dentro do possível a cumprir o que prometeu do que o passado governo da direita.


Quer se queira, ou não, estas manifestações reivindicativas são aproveitadas para o protesto político, pese embora o facto da justeza, ou não, das exigências a que chamam direitos que em tempo lhes foram retirados.


Jerónimo de Sousa, após as eleições autárquicas, deu a tender que as populações só tinham a perder ao desviarem o seu voto e que não tinham dado o devido valor à luta que o PCP tinha encetado pela reposição e recuperação de salários e direitos atribuindo culpas a tudo quanto foi a oposição contra a CDU.


O comunicado emitido pelo Comité Central do PCP é esclarecedor quando diz: “No resultado da CDU fica evidente que muitas das pessoas que durante este período nos dirigiram palavras de reconhecimento pelo papel decisivo do PCP na derrota do governo PSD/CDS ainda não ganharam a consciência da contribuição decisiva do PCP em muito do que foi alcançado na reposição e conquista de direitos e que reside no reforço do PCP e do PEV, e não no PS, a possibilidade de assegurar que esse caminho prossiga e se amplie.”


Posição estranha esta, já que o PCP, tendo um saber político de experiência feito ao longo de anos, tenha desvalorizado durante a disputa da campanha eleitoral por lugares de poder autárquico em que não há amigos e que, por isso, cada uma das forças em presença faz por ganhar. Todavia, terá razão quando afirma que a campanha foi muitas vezes baseada em argumentos falsos e muitas vezes ofensivos. Mas isto é o que se passa em todas as campanhas eleitorais.


Mais à frente, o mesmo comunicado critica a tese neoliberal de empobrecimento enaltecido por Passos Coelho no tempo do seu governo de direita e diz que “A evolução mais recente da economia nacional derrota a tese que identificava o crescimento económico com medidas de agravamento da exploração e de empobrecimento que foram impostas ao povo português ao longo de anos, e dá sustentabilidade à necessidade de aprofundar ainda mais o caminho de reposição de direitos, de aumento de salários, das reformas, pensões e apoios sociais, de resposta a problemas mais sentidos pelos trabalhadores e a população.” O PCP não tendo ainda abandonado a sua visão centralizadora e deslumbrado por economias estatais defende em qualquer contexto tudo quanto sejam reivindicações como se os recursos financeiros fossem infinitos e o orçamento de estado um poço sem fundo.


O PCP ao acionar a correia de transmissão dos sindicatos que controla faz também o jogo de partido populista ao explorar emoções das classes profissionais utilizando para tal o aumento de rendimentos, de regalias e de direitos, sabendo que cada uma delas olha para o seu próprio umbigo. Por seu lado a direita quando não está no poder acompanha e apoia sempre que pode, mas com discrição, os movimentos da esquerda e dos sindicatos onde tem insipiente influência.


Quando a economia cresce um pouquinho, nem deixam assentar. Logo que lhes cheira a dinheiro preparam-se para toda a espécie de reivindicações. Todos querem comer à mesa do orçamento.


Quando depois se dá um a passo maior do que a perna volta tudo ao mesmo. É sempre o mesmo, quando está no poder um governo socialista. Sempre foi assim. Admiram-se depois dos ciclos de austeridade. Mas, quando uma qualquer direita o substitui no poder tudo fica de mansinho e tímidas manifestações surgem que logo se esfumam.


As últimas eleições autárquicas parecem ter demonstrado que nem sempre os partidos que reclamam os louros da recuperação de rendimento, direitos e regalias sociais não são necessariamente os que são os mais favorecidos. Daqui que se pode inferir que não existe uma correlação direta entre os dois factos. Existem outras variáveis que complexificam o modelo de análise.


Em alturas em que as populações valorizam a estabilidade social nem sempre veem com bons olhos a existência de movimentos reivindicativos excessivos e extemporâneos (que para os sindicatos são infindáveis) tendo um efeito perverso porque quando há eleições já foi esquecida a fonte do movimento.

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