O aparecimento do novo coronavírus SARS-CoV-2, responsável pela doença Covid-19 trouxe para a linguagem corrente a utilização de novos conceitos como confinamento, distanciamento social, distância social que não se devem confundir com isolamento social.
Em situação dita normal a interação social é uma necessidade e uma obrigação. A maior parte das nossas vidas são ocupadas por interações de vários tipos. Todos falamos em interação social, mas o que a define em termos sociológicos é o encontro social entre indivíduos. Isto é, são situações formais e informais nas quais as pessoas travam conhecimento umas com as outras. Por exemplo uma sala de aula constitui uma boa imagem de uma situação formal de interação social. O encontro de duas pessoas numa festa ou numa rua é um exemplo de interação informal.
A interação social tem formas mais complexas: a interação desfocalizada quando se desenrola entre duas pessoas presentes num determinado espaço, mas que não estão envolvidas numa situação de comunicação direta face a face, é também a consciência mútua que indivíduos têm uns dos outros em grandes concentrações de pessoas quando não estão diretamente a conversar; a interação focalizada passa-se entre indivíduos envolvidos numa atividade comum ou numa conversa direta uns com os outros. Esta é a situação mais comum quando nos referimos ao distanciamento social. Os episódios de interação nesta situação ocorrem quando dois ou mais indivíduos estão diretamente com atenção ao que os outros estão a dizer ou a fazer.
Este distanciamento social que nos impõem e noutros casos autoimposto como obrigação para nos protegermos e aos outros da contaminação pela Covid-19 vai contra a nossa compulsão de proximidade devido à necessidade que sentimos de nos encontrarmos com outros em situação presencial e face a face que fornece informação muito mais rica acerca de como as outras pessoas pensam e sentem.
Os seres humanos devido a esta imposição passarão a valorizar mais o contacto direto, talvez ainda mais do que antes, apesar das comunicações via eletrónica a que se têm sujeitado ao longo das últimas décadas.
Ao que agora chamamos distanciamento social, a respeitar como segurança que evite ou reduza a transmissão do vírus, está relacionado com o que em sociologia se denomina como espaço social. A maior parte das vezes as pessoas, nas culturas ocidentais, mantêm uma distância pelo menos de um pelo menos um metro quando as pessoas se envolvem numa interação com outros. Já no médio oriente as pessoas geralmente permanecem mais próximas do que é aceitável no ocidente como é o caso em Portugal.
Edward Hall estudou sobre o tema das comunicações não verbais e distinguiu quatro zonas de espaço privado. A distância íntima até cerca de meio metro, reservada a muitos poucos contactos sociais. A distância pessoal cerca de meio metro até metro e meio, distância normal em encontros com amigos e conhecidos relativamente chegados. A distância social de cerca de um metro e meio até três metros e meio que é a zona normalmente estipulada para contextos formais de interação. A distância pública mais de três metros e meio preservada entre os que atuam perante uma assistência.
As zonas mais sensíveis são as das distâncias íntima e pessoal. Quando estas zonas são invadidas as pessoas tentam readquirir o seu espaço e distanciam-se. É o que se deve praticar em contextos epidémicos como aquele que estamos a atravessar.
Quando há necessidade de uma proximidade maior do que a considerada desejável estabelece-se uma espécie de fronteira física o que se passa a verificar por exemplo em supermercados em que entre a caixa e o cliente passaram a existir separadores acrílicos.
Já nos transportes públicos a lei do distanciamento não é praticável pelo que há necessidade de tentar proteger os espaços pessoais através de mecanismos de distanciamentos de segurança.
Ao contrário do que se passa nas sociedades tradicionais, nas sociedades modernas interagimos constantemente com outras pessoas que nunca vimos ou conhecemos. Praticamente todos os nossos encontros quotidianos como compras nos supermercados, idas aos bancos ou idas a outros locais fazem-nos entrar em contacto indireto com pessoas que poderá viver em locais afastados do nosso. Contudo a internet e o comércio online proporcionam cada vez mais interações indiretas e estão a tornar-se “afónicas” com o aumento das potencialidades da tecnologia que têm evoluído para que som e a imagem passem a fazer parte do quotidiano das interações.
Com as restrições aos encontros de proximidade e isolamento social cresceu uma espécie de compulsão de proximidade que é a necessidade de as pessoas interagirem presencialmente com outros seja em casa, no trabalho, nos transportes, nos eventos religiosos, culturais, etc., muito para além da comunicação via internet ou outro meio eletrónico.
Os jovens são quem as restrições aos convívio social e o confinamento terão mais efeito pois ficaram privados de interagir com os seus pares nas creches, nas escolas, nas universidades e nos espaços públicos quando se juntam nos bares, nas discotecas ou nos concertos frequentados por grandes multidões, são eles que sentirão mais a compulsão de proximidade. Os idosos são outro grupo que sentirão a compulsão para estarem próximos dos seus familiares e amigos mais próximos.
Os idosos que hoje constituem uma grande parte da população que tem sentido ao longo dos tempos uma discriminação etária nos países desenvolvidos como agora também se tem confirmado com a epidemia da Covid-19. A comunicação social tem a sua quota parte por haver alturas em que incidia a gravidade da epidemia nas idades avançadas fazendo passar no início erradamente a mensagem de que a doença atacava os mais velhos, o que é não é verdade apesar da taxa de letalidade ser maior nesses grupos por motivos de várias fragilidades independentes do vírus atacante.
Por norma a pessoa doente não é pessoalmente responsável por estar doente. A doença é vista como o resultado de causas físicas que estão para além do controlo do indivíduo, isto é, o desencadear da doença não está relacionado com as ações ou o comportamento do indivíduo. Sê-lo-á em situações normais, mas, no caso de doenças epidémicas que são transmitidas de indivíduo para indivíduo, não o é. É o caso da Covid-19 cujo desencadear da doença está relacionado com o comportamento de cada indivíduo determinado pelas suas interações sociais.
Há ainda considerações com o estigma que certas doenças podem desencadear nos grupos sociais distinguindo-os da maioria da população. O que faz com que indivíduo ou grupos sejam tratados com suspeição especialmente quando a doença é vista como especialmente infeciosa as pessoas podem ser rejeitadas pela população saudável. Os estigmas baseiam-se, embora raramente, em conceções válidas que nascem de perceções falsas.
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