Começo por citar uma passagem do
livro “A Arte da Guerra” de Sun Tzu:
“Não permitas
que o inimigo tome a dianteira… Qualquer negligência nesse sentido pode ter
consequências nefastas. Em geral, só há desvantagem em ocupar o terreno depois
do adversário”; “se os seus métodos de comando (do general) são inflexíveis, se
examina as situações de acordo com esquemas prévios, se toma as suas resoluções
de maneira mecânica, é indigno de comandar.”.
António Costa está a dar vantagem
ao estar a ocupar o “terreno” antes do adversário. Está a dar a possibilidade para
o adversário atacar por antecipação.
Não li a entrevista completa que
Ângelo Correia deu à TSF-DN, pelo que apenas me refiro a uma frase que ele
disse: "António Costa está a criar um mártir que se chama Chega".
Foi uma ideia que, logo após o PS
ter ganho as eleições, me passou pela cabeça logo após as palavras de António
Costa ao dizer que não iria ouvir o CHEGA. O primeiro-ministro, António Costa, começou a
ouvir na quarta-feira vários setores da sociedade civil, estando prevista uma
reunião com cada um dos partidos com representação parlamentar, à exceção do
Chega.
Por outro lado, a comunicação
social que se mostra porventura hipocritamente alarmada com a possibilidade de
crescimento da extrema-direita, deu palco exagerado à questão da vice-presidência
para a Assembleia da República caso que para as pessoas não tem muito
interesse. Também sabemos que no Parlamento Europeu tem havido reações à
extrema-direita. Como noticiou
o jornal Público: “O “cordão sanitário” em torno dos representantes dos
partidos de extrema-direita da UE voltou a funcionar na eleição da presidente e
vice-presidentes do Parlamento Europeu e das comissões e subcomissões, a 18 de janeiro.
Todos os candidatos do grupo Identidade e Democracia falharam a eleição por
voto secreto.”.
Ângelo Correia deu o mote para que
o CHEGA de vítima possa passar a reivindicar o título de mártir. Contudo, concordo
em parte, com ele. António Costa tem que ter, como teve até aqui, a agilidade/estratégia
política de, por vezes, saber engolir sapos vivos e fazer disso uma estratégia
política sem abalar as suas convicções.
A democracia é frágil. É do conhecimento
que, mesmo em democracias consolidadas e aparentemente robustas, é possível eleger
governos de partidos que podem vir a ser uma espécie de associação extremista
de direita e conseguir manter pelo populismo o apoio entusiástico de uma parte
considerável das pessoas.
Na política, por vezes, há que
deixar que esses mostrem que são grandes D. Quixotes a lutar contra a
democracia liberal representativa, a que chamam o sistema a derrubar que, para
eles, é o seu principal inimigo.
Temos que encarar a realidade de
que houve uma parcela significativa do povo que, conscientemente, ou não, votou
num D. Quixote e nos seus Sanchos Pança e lhes colocou uma lança na mão.
Um político estratega que defenda
a democracia não deve querer confrontar-se sozinho contra D. Quixotes para os
quais por uma espécie de doença a democracia é, qual moinho, um obstáculo a
derrubar. Contudo deve notar-se que não podemos deixar de estar atentos a essa
doença porque o perigo existe e é alimentado pelos escândalos de corrupção,
pelo clientelismo, pelas promessas não cumpridas, pela promiscuidade entre
políticos, poder económico e jornalistas, pelo amiguismo que assombram as
elites e passam impunes e que geram o populismo que é sintoma da fraqueza
democrática.
Uma formação política que parecia
insignificante transformou-se em dois anos na terceira força política em Portugal.
Esta extrema-direita extremista parece estar a erguer-se sem dificuldade, com a
coresponsabilidade da direita moderada que, à falta do poder e sem maioria, lá
vai aceitando migalhas que, afinal, são restos do pão fabricado com a sua própria
massa.
Os partidos democráticos da
esquerda à direita parecem não estar a sentir o ar que se respira na Europa e
que exala para o lado de cá. Os partidos da direita parecem preocupar-se mais com
um partido democrático que dá pelo nome de “socialista” e mostram a
incapacidade de travar uma mistura explosiva nascida da sua área. Como não
querem ser a consequência lançam a causa para outros com disparates como este: “O
PS já percebeu: é preciso que o partido de Ventura cresça muito mais, para ser
inevitável à direita, com a consequente consolidação nos socialistas quer do
voto flutuante do centro quer do voto útil da esquerda.”
Não podemos, nós, portugueses,
ser a sobremesa dos partidos radicais da extrema-direita que aproveitam para crescer
a partir de sentimentos dos cidadãos que respeitam os valores mais conservadores
e tradicionais associados à crise económica como a perda da individualidade, a
família, a nação, a religião, a identidade sexual e outros modelos impulsionados
por outro tipo de radicais, os de esquerda.
A direita e a esquerda atacam-se
mutuamente com expressões de fascistas, “venezuelização”, chavistas do país, comunistas,
coletivização e outros disparates do género. A direita que diz ser democrata ataca
o partido socialista que tem demonstrado desde a revolução de abril ser um dos
garantes da democracia, tenta mostrar que existe o perigo do coletivismo e da
perda da liberdade e outros vitupérios, que em nada tem a ver com a realidade
vivida, alinhado com os partidos mais radicais da extrema-direita à medida das
circunstâncias convenientes.
A direita, nomeadamente o PSD que
diz ser um pilar e um dos fundadores da democracia, para poder chegar ao poder
na Região Autónoma dos Açores fez acordos de incidência parlamentar com o CHEGA.
Ou seja, PSD, CDS, PPM e CHEGA, viabilizaram um executivo regional, mas de
entre eles há quem se recuse a aparecer em público com elementos do partido a
que se juntaram. Recorde-se que André Ventura disse que não iria governar com
partidos do sistema, mas por cá, no continente, pretende por todos os meios estar
presente no sistema que diz querer combater, rejeitar e mudar.
Ventura nunca se acanhou de dizer
que pretendia destruir o sistema por dentro, de prometer fazer tremer o sistema
para construir uma nova república. Era a já conhecida estratégia utilizada por
outros da mesma estirpe na Europa, destruir o sistema por dentro. Vemos agora e
a tempo que a intenção era apenas metafórica: na verdade o que quer mesmo é lugares
no sistema.
A melhor forma de destruir este
tipo de partidos é deixá-los estar presente para depois, dentro do sistema onde
se conseguiram instalar, os desmontar, mas, para tal, é necessário que todos os
partidos que se dizem democráticos de direita ou de esquerda se unam nesse
objetivo e que a direita democrática que dá pelo nome de PSD se deixe de
ambiguidades.
De qualquer modo penso que foi um
erro estratégico de António Costa excluir o CHEGA na receção dos partidos. Receber
e ouvir o outro não significa aceitar, pactuar, seguir, negociar seja o que for.
É assim a diplomacia interna. Receber alguém para ouvir o que tem a dizer, ainda
que de antemão já saibamos o que vamos ouvir, não significa tomar chá nem
dançar o tango.
Está a dar-se força ao dito
partido para uma atitude de mal dizer, gritar contra a marginalização a que foi
sujeito e outras frases feitas que tenham impacto em que André Ventura se especializou
para que se faça eco na comunicação social.
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