A “pax romana” foi
um período que se situou entre 27 a.C. e 180 d.C. que garantiu naquela época
histórica estabilidade e tranquilidade. Também nós, na Europa, atravessámos uma
pax europeia até à invasão da Ucrânia confrontando-nos agora com uma
guerra perto de nós. Paz que do meu ponto de vista está longe de ser conseguida
por teimosia de um invasor que parece pretender substituir a liberdade que tem sido
o atributo da democracia europeia por outro tipo de ordem iliberal não
democrática.
Parece que Lavrov, ministro dos
negócios estrangeiros da Rússia, foi à China e fez declarações em que anunciou uma
"nova ordem mundial, multipolar, justa e democrática" acrescentando
que “a situação internacional ficará muito mais clara, e que nós, juntamente
com vocês e com os nossos apoiantes, caminharemos para uma ordem
mundial multipolar, justa e democrática”, o sublinhado é meu. A que justiça e democracia
se refere? A hipocrisia do Governo russo não tem limites quando menciona a
palavra democracia, palavra que para eles não tem qualquer valor.
Os apoiantes desta tese também os
há por cá que aproveitam a invasão da Ucrânia como pretexto para criticar
fortemente o ocidente, nomeadamente a NATO, os EUA e a U.E., pelas mais
diversas razões. Estes centram-se apenas no princípio da responsabilidade da
guerra justa que exige que se examine de quem é a responsabilidade na guerra,
olhando apenas para o lado do agressor desvalorizando o ato ilícito da invasão contribuindo
para satisfação do invasor Putin que, sendo contrário ao sociocentrismo, está a
olhar o mundo duma perspetiva estreita e egocêntrica não se terá apercebido que
a Rússia pode sobreviver sem Putin, mas duvida-se que Putin possa sobreviver
sem a Rússia.
O presidente autocrata Vladimir Putin
não está a colocar as necessidades e as preocupações do povo russo à frente dos
seus próprios interesses. O anti sociocentrismo de Putin parece estar a ser
agravado por uma esquizofrenia política com uma patologia que se manifesta por
uma rutura de contacto com o mundo exterior, por isso a informação sobre a
invasão da Ucrânia estar a ser condicionada e censurada, tal como a proibição
do direito à manifestação, impensável num regime democrático.
Numa conferência de imprensa, em
2017, Vladimir Putin terá respondendo a uma pergunta sobre um artigo
publicado no Washington Post no qual se escrevia que, numa reunião do Salão
Oval com diplomatas russos, Donald Trump lhes passou certas informações
confidenciais sobre o ISIS, (Islamic State of Iraq and Syria), deu como resposta que o ocidente estava a
desenvolver uma "esquizofrenia política".
Recorde-se que poucos dias antes
da data trágica da invasão, quando Biden dizia que Putin iria invadir a
Ucrânia, este dizia que o ocidente estava a entrar em histeria. Afinal não era
histeria, eram certezas.
Após meses de ter negado que
tinha intenção de atacar a Ucrânia, Vladimir Putin invadiu o território duma
democracia europeia por ar, terra e mar a que chama uma operação militar
especial, palavras também utilizadas em artigos por quem se coloca contra o
ocidente para justificar a invasão como um senhor coronel Matos Gomes que
escreve textos sobre agressões passadas do chamado ocidente noutros contextos
geográficos o que nos leva a deduzir que se estará a colocar do lado oposto.
Afirmou Matos Gomes em 24 de
fevereiro que "Não se trata de uma invasão. Penso que a Rússia e Putin falou
e apresentou os objetivos claramente no discurso. O que a Rússia pretende é que
a Ucrânia seja desmilitarizada e não seja uma base de ataque à Rússia. E isto
ele disse-o muito claramente". Se isto não é defender a invasão perpetrada
por Putin então o que é? Pelas imagens que nos chegam diariamente podemos ver que,
afinal, se trata de uma invasão, de uma guerra.
Perguntava-se no início qual era
o objetivo do presidente russo ao invadir a Ucrânia. A justificação dada era o
avanço da NATO para o Leste Europeu para cercar a Rússia.
Face à intransigência de um adversário
que se tornou hostil e traiçoeiro que se ergue a agredir outro povo a resposta
do ocidente foi tentar encurralar Putin, o que significa encurralar também o
povo russo, embora se considere pouco sensata a estratégia que poderá brigar
Putin, que não quer perder a face perante os russos, a ficar sem margem de
manobra.
Decorridas duas semanas de
guerra, o presidente ucraniano propunha negociações e que deixava cair a adesão
da Ucrânia à NATO. Afinal, não era apenas aquela a exigência que Putin pretendia.
Ainda há dias Zelensky cedeu na proposta de neutralização para chegar a um
acordo de paz. Quem não quer a paz?
O que fazer então quando Putin ultrapassou
todas as linhas vermelhas que o colocam em direção à meta dos criminosos de
guerra. Terá sido a aproximação da NATO que terá levado, segundo ele, à “operação
militar”. Mas há outra, que Putin não revela, essa de ordem interna.
Desde 2017 que Putin se confronta
com problemas internos na Rússia que terão começado a surgir apesar de ter
ganho(?) as eleições presidenciais de 2018. Enfrentou, e estará ainda a
enfrentar, situações difíceis devido às consequências das suas políticas quer externas,
quer internas. O vazio da política interna está a ser substituído pela ilusão
de sucesso internacional, criado e mantido com a ajuda da propaganda mais
descarada da história da Rússia moderna, nem sei se Estaline e os anos
seguintes da URSS o terão conseguido tão eficazmente, quer pela repressão quer
pela censura. Também é certo que tecnologias como as de hoje para essa
propaganda não existiam.
Na Rússia de Putin a Internet no
seu todo ainda não foi proibida, mas canais de informações mesmo os alternativos
como as redes sociais já foram condicionados à população através de todos os
filtros disponíveis pelo governo para evitar a corrosão lenta dos chavões propagandísticos.
Contrariamente ao resto do mundo,
a população russa não tem, na sua grande maioria, conhecimento do que se passa
no país vizinho. Vladimir Putin proibiu a comunicação social da Rússia de usar
as expressões "guerra" ou "invasão" e enganou os russos ao
dizer que estavam a ser realizadas "operações militares especiais" na
Ucrânia. As redes sociais também começam a ficar cada vez mais limitadas e as
publicações censuradas, mas na quinta-feira, 11 de março à noite, a televisão estatal
russa, o canal “Rússia 1” que é uma das emissoras estatais mais vistas no país
e uma das que tem seguido as diretivas autoritárias do Kremlin, leia-se de
Putin, quanto à situação da Ucrânia, consentiu numa provocação ao transmitir em
direto em horário nobre a opinião de um comentador que criticou a ofensiva
russa recusando-se a apoiar a narrativa das televisões encomendada pelo Governo
russo.
Semyond Bagdasarov, um famoso
académico e deputado russo, aproveitou a sua presença no programa 'An Evening with
Vladimir Soloviev', “Uma noite com Vladimir Soloviev (um homem referido como
forte defensor de Putin e um crítico franco da independência da Ucrânia e
propagandista-chefe) para pedir ao presidente russo que ponha fim ao ataque,
deixando ainda o alerta de que os aliados da Rússia, como a China e a Índia,
podiam acabar por virar as costas a Moscovo.
Por seu lado Karen Georgievich Shakhnazarov, realizadora russa Karen Bagdasarov pediu ao líder russo para acabar com o ataque, enquanto tentou quebrar a narrativa do Kremlin de que está conduzindo uma "operação especial" limitada na região de Donbass, fazendo referência aos ataques à capital de Kiev.
No dia 4 de março a decisão do governo russo de bloquear oficialmente o acesso
ao Facebook relativamente à invasão por Moscovo/Putin da vizinha Ucrânia
provocou uma reação do Presidente para os assuntos Globais da Meta que escreveu
no Twitte: "Em breve, milhões de russos encontrar-se-ão isolados de
informações confiáveis, privados das de se ligar com a família e amigos e
silenciados de falar". Continuaremos a fazer tudo o que pudermos para
restaurar os nossos serviços para que permaneçam disponíveis e para que as
pessoas se expressem com segurança e se organizem para a ação."
Os males causados pela diminuição
do rendimento das famílias, agravados pelas medidas severas das sanções económico
e financeiras, aumentam a crescente desconfiança pública nas autoridades, no descontentamento
público gerado por um governo ineficiente, com a corrupção e cleptocracia que
o sistema permite ou aprova e com o aventureirismo geopolítico com enormes
custos como o demonstram especialista em política russa.
O Presidente Putin encontra-se num
beco político sem saída, enquanto o povo se encontra numa crise existencial que
lhe está a ser induzida pela propaganda que afirma que o ocidente quer destruir
a Rússia.
Biden e Putin parecem ter entrado
numa esquizofrenia que se manifesta pelas emoções que os levam a utilizar, sobretudo
o primeiro, com uma verbosidade de palavras de baixa política com as
adjetivações que faz a Putin com que lhe poderão ser aplicadas, mas que envergonham
qualquer diplomacia. A esquizofrenia de Putin é mais sofisticada, aproxima-se da
metafísica ao pretender transcender a própria realidade sem o conseguir levando
o povo russo a pensar se a Rússia não estará, de facto, a atravessar uma crise
existencial que o ocidente lhe estará a causar.
Vladimir Putin ficou subitamente
nervoso com o facto de poder vir a ser o arquiteto que, devido à invasão da
Ucrânia, conduziu a Rússia para uma crise económica e financeira sem
precedentes pelas sanções do ocidente, porque sabe que isso tem como ricochete poder
voltar o povo contra ele.
Com a informação disponível, credível,
fiável e isenta de facciosismos sobre o que na realidade se passa na Rússia é ao
pouco ou nada. Isto devido a que os jornalistas não podem trabalhar no país a
não ser clandestinamente, enquanto no ocidente, onde há liberdade jornalística
e onde se exerce livremente essa liberdade de expressão.
Apesar do senhor que manda no
Kremlin lutar para esconder a realidade da guerra no ocidente textos e mais
textos são publicados e republicados em blogs e redes sociais e explanações
históricas de ditos especialistas em política internacional e geoestratégica de
esforçam por atacar/condenar os EUA, a NATO, e a EU, como se fossem estes os
agressores, defendendo a paz, tornando claro que são contra a guerra, mas, ao
mesmo tempo, justificam os pontos de vista de Putin.
Alguns pretendem desacreditar a
informação chamando pensamento único aos que não alinham em argumentos de
crítica aos países do ocidente que pretendem que sejam os causadores da invasão
da Ucrânia por Putin designando, como ele, “intervenção militar pacífica” ou “intervenção
militar especial”. Pretendem assim justificar o mal que é a guerra na Ucrânia
com o mal causado e apoiado por outros (os EUA) noutros contextos diferentes.
Para os das esquerdas radicais, anti
ocidente, anti NATO e para os discretos apoiantes de Putin que se dizem defensores
da paz é difícil reconhecer que os interesses de cada uns dos lados, Ucrânia e
Rússia, devem ser tidos em conta. Mas, pelo que se depreende das opiniões que escrevem
e das publicações de textos oriundas de fontes alinhadas pelo mesmo tom parece
que, pelo contrário, são a favor do estabelecimento de linhas vermelhas
inamovíveis que sejam contra os valores morais, princípios da democracia e
regras internacionais que devem ser respeitadas e inegociáveis.
Porém, há também grandes
organizações como o banco HSBC que alinham, talvez por interesses financeiros
estar nas boas graças de Putin e da sua propaganda. Segundo o Financial
Times, o HSBC também suaviza o tom com o qual se refere à guerra na Ucrânia,
retirando dos seus relatórios referências à palavra "guerra", noticia
o "Financial Times", alterando a palavra "guerra" para
expressões mais suaves, como por exemplo "conflito". Alinha assim com
o Kremlin que desde o primeiro dia chama à invasão da Ucrânia uma "operação
militar especial".
Nesta altura atacar o ocidente e
ao mesmo tempo fazer pedidos de paz é, quer se queira ou não, estar do lado do
presidente Vladimir Putin o que se evidencia, como anteriormente referi, em textos
publicados a quem a eles recorre para reforço dos seus argumentos. Um dos casos
foi o recurso a um artigo de opinião escrito por Mário
Soares em maio de 2015 na Revista Visão quando criticou a aproximação da
NATO para Leste com a adesão de países como a Polónia entre outros. Interpretação
abusiva do que ele escreveu que era mais um alerta para o ocidente. Mário
Soares tinha razão. A aproximação da NATO para leste foi uma consequência do
desmantelamento da URSS e a libertação dos países de leste do jugo comunista.
Foi nesta sequência que alguns desses países pediram a adesão à E.U. e a
pretensão de entrarem para a NATO. Esta pretensão talvez fosse devido à
insegurança que teriam em relação a possíveis agressões do Kremlin para
recuperarem a sua antiga jurisdição sobre esses países. Mas, Mário Soares também
escreveu que “Vladimir Putin é um homem perigoso. Ou, como dizem os
brasileiros, um homem astuto, perigoso e imprevisível”. Apesar deste evidente
ponto de vista o autor, enquanto Primeiro-Ministro e enquanto Presidente da
República, nunca colocou em questão a retirada de Portugal daquela aliança
militar intergovernamental.
Aqueles que falam da desmilitarização
do ocidente, de paz e do aumento das verbas e de gastos com a defesa no
orçamento da U.E. esquecem-se, ou omitem, nos seus relatos que a Rússia é considerada
pela maioria dos analistas como a segunda maior potência militar do mundo
e com grandes investimentos nas forças de guerra e que agora se encontra em grande
vantagem e, por isso, lançou-se numa operação invasiva de um país soberano.
O semanário Expresso de 9 de
março de 2022, recordava o que Pulido Valente escreveu a criticar a forma como
a Europa se foi desarmando, e alertava para os riscos de “a Inglaterra
gastar em defesa menos de 2% do PIB, num momento em que Putin embarcou numa
política claramente agressiva e revanchista”.
Face a tudo isto deveria então o
ocidente, nomeadamente a E.U., desproteger-se? Não. Mas foi o que aconteceu e
parece que para alguns radicais de esquerda que assim deveria continuar.
A invasão da Ucrânia não terá
sido uma surpresa visto que a presidência dos EUA, em 22 de novembro de 2021, segundo
o “site” francês “Meta-Defense”, previu uma ofensiva na Ucrânia pela Rússia no
inverno, a ocorrer em janeiro e ou fevereiro. Publicava na altura que “O
objetivo previsto seria a criação de um corredor que permitisse ligar a Crimeia
à Rússia por via terrestre, provavelmente até a foz do Dnieper e a cidade de
Zaporizhia, também um importante centro industrial em termos de aeronáutica
civil e militar, mas também a cidade portuária de Mariopol, crítica em termos
de infraestrutura. Além de ligar a Crimeia, isso permitiria a Moscovo transformar
o Mar de Azov num mar “interior”, inteiramente limitado pela costa russa”.
Apesar do senhor que manda no Kremlin
lutar para esconder a realidade da guerra no ocidente textos e mais textos são
publicados e republicados em blogs e redes sociais e explanações históricas de
ditos especialistas em política internacional e geoestratégica de esforçam por
atacar/condenar os EUA, a NATO, e a EU, como se fossem estes os agressores,
defendendo a paz, tornando claro que são contra a guerra, mas, ao mesmo tempo,
justificam os pontos de vista de Putin.
Estranhamente são também os que
debatem e se empenham na busca do que se fez de mau no passado para
justificarem que se faz de mau no presente. São os mesmo que pedem a
desmilitarização do ocidente (porta escancarada para a entrada de Putin até ao
ponto da possibilidade da sua ambição) e que exigem negociações diplomáticas
para se chegar à paz. O ponto que não esclarecem é como isso será possível com o
cinismo de quem diz que quer negociar e ao mesmo tempo diz não estar disponível
para quaisquer negociações que não seja a capitulação do invadido com condições
impostas pelo invasor, como tem vindo a ficar demonstrado.
Penso que esta retórica dos que
se mostram contra os aliados ocidentais e que tão insistentemente invocam
negociações para a paz não são mais do que fait divers para dissimularem
o seu alinhamento com os senhores do Kremlin, a quem chamam capitalistas, ao
mesmo tempo que se distanciam dos outros que são o rebanho aos que se afastam dos
pontos de vista deles.
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