Quem sou eu para comentar, bem ou mal, o que doutos professores
catedráticos, comentadores, experimentados políticos, conceituados jornalistas,
analistas políticos (que proliferam nos canais de televisão), sindicalistas,
bastonários de ordens profissionais que fazem política pró- partidária,
cientistas, e muitos outros. Uns sentados nos bancos do serviço público e outros
que se movem no mundo das instituições privadas onde praticam elaborações de
leis e defesas de alta corrupção, mas que escrevem e proferem opiniões sobre
tudo, mesmo sobre o que não dominam, nos vários órgãos de comunicação social,
da imprensa à televisão. Lançam
sabedoria que o público admira e consome. Sendo, conhecidos, sobretudo, pelos
seus prognóstico e oráculos, obtidos por canais privilegiados e informais de
amigos do governo ou de fora dele. Conjetura-se
que transacionem informações sobre processos de investigação criminal em
segredo de justiça e, como troca, entra-se no jogo do dás-me isso e eu dou-te aquilo.
Quem não têm amigos e conhecidos em postos chave há intermediações
a fazerem-lhes chegar às mãos informações privilegiadas para em seguida emitirem
opiniões escritas ou verbalizadas de algo que desconhecem sobre pessoas públicas
que têm uma reputação a defender. É extraordinário que ninguém lhes pergunte
pelas provas do que afirmam com tanta certeza, que ninguém pergunte onde estão
os factos que justificam as suspeitas, enfim, que ninguém pergunte nada, apenas
suspeições. É o velho aforismo da mentira tantas vezes repetida que passa a ser
verdade.
Parece-me vir a propósito a forma como vejo de fora a
imprensa e a televisão a formatarem e a lançarem para o público a informação
editada. Por muito que se diga o contrário os media e os jornalistas são atores
políticos que muitas vezes seguem subtilmente agendas partidárias ou
ideológicas consequentes das especificidades editoriais.
A relação entre os órgãos de comunicação social e a política
acentuou-se consideravelmente de tal forma que é impossível conceber a política
sem a existência de um ambiente jornalístico, notando-se da parte dos políticos,
sobretudo, quando num governo, envidarem esforços para controlar as margens de
incerteza resultantes de um relacionamento dinâmico com a opinião pública. Um
caso paradigmático é a falta de estratégia para controle de danos, para alguns deixado
ao acaso dos acontecimentos, como aconteceu com o ministro António Cabrita.
Atualmente a ferramenta mais eficaz para comunicar com o
público, ou melhor com os eleitores, é a televisão que, no entanto, é mediada/conduzida
por jornalistas. Em última análise, empresas mediáticas que se orientam por
valores e princípios distintos daqueles que são defendidos por poderes democraticamente
eleitos, passa a haver uma tensão latente entre os media e esse tal poder
político, sobretudo quando este não é da “simpatia” de algumas redações. Isto
passa-se com um qualquer candidato seja ele a líder partidário, a ministro ou a
primeiro-ministro de um governo quando não é o preferencial por um determinado órgão
de comunicação.
O desagrado com alguns políticos e práticas políticas, com determinado
governo ou com um primeiro-ministro pode manifestar-se num ataque cerrado por
parte do media. É frequente a insistência diária e sistemática sobre o mesmo
assunto, nomeadamente das televisões, a incidência em aspetos negativos sobre
uma qualquer figura pública da política, atuação ministerial, mau funcionamento
de instituições e falhas em determinada área como forma de colocar em desfavor a
opinião pública considerando tal atitude como a de escrutinar o poder.
Em democracia o escrutínio do exercício político dos
governos e do poder político, são uma das mais importantes
e legítimas funções do
jornalismo, mas a liberdade de imprensa não é um privilégio dos jornalistas,
mas sim uma condição da liberdade de expressão dos cidadãos visto estes só
poderem captar um conjunto muito limitado de acontecimentos.
Os jornalistas não foram eleitos nem representam
oficialmente ninguém, mas têm um contrato informal com os cidadãos numa espécie
de procuração que lhes confere o dever de zelar pelo cumprimento dos valores
democráticos e denunciar as suas falhas, através de uma informação isenta
e verdadeira. Sublinho isenta porque considero ser óbvia a verdade e a isenção no
jornalismo sério.
Por vezes alguma comunicação social atua tendenciosamente através
da procura e da insistência em factos marginais para desacreditar na opinião
pública um cidadão ou um poder político porque pertencem a uma dada área
partidária e ideológica que pretendem atacar.
Um caso evidente e atual e que tomo como exemplo do que refiro
são as falhas nos serviços de saúde públicos, tema sensível na opinião pública,
que têm sido são diariamente salientados durante o atual Governo mesmo durante a
contingência das vagas da crise pandémicas. Os meios de comunicação não devem,
nem podem, tentar omitir os problemas que se passam no SNS que acho devem ser
noticiados nos limites do bom senso e do não alarmismo. Alguns dos problemas no
interior dos serviços do SNS que nos chegam como telespectadores fica-se com a
perceção de que são por vezes organizados para criar instabilidade sobre o
sistema e as ordens dão uma ajuda, mas quando o poder pertence a uma área
ideológica da sua “preferência” os mesmos media manifestam mais complacência para
com os problemas detetados e dados como notícias marginais.
Vejamos o caso mais paradigmático quando, durante o Governo
PSD-CDS com Passos Coelho primeiro-ministro, a esquerda o pelos cortes no SNS.
Durante esse período órgãos de comunicação afetos à direita que, pressurosamente,
publicam notícias, comentários e opiniões favoráveis omitindo, na altura, os
reais problemas.
Situemo-nos então no caso do SNS ao tempo do Governo de
Passos Coelho. Quando em janeiro de 2015 Passos justificava que a qualidade do
SNS não podia ser aferida pelas falhas registadas que coincidiram com o período
de crise no país e reconhecia que a pressão e o escrutínio mediático criavam
muita pressão. Sobre o agravamento nas
urgências hospitalares, Passos dizia na altura que "não se confunda o que
se está a passar, se passa em Portugal" com o que "se tem passado
noutros países" de "uma forma anormal, desafiando a capacidade
instalada e a qualidade dos profissionais".
O que se verifica hoje apesar da pressão causada no SNS pela
pandemia covid-19 é que sindicatos e ordens de médicos e enfermeiros que se
juntam para fazer coro nos órgãos de comunicação que diariamente e com presteza
por via do SNS pretendem atacar o Governo.
Também em janeiro de 2015 durante o Governo de Passos Coelho
num debate
com o primeiro-ministro na Assembleia da República a dirigente Catarina Martins
do BE criticava Passos por não ter apresentado "uma única medida que o
Governo tenha tomado para contrariar o descalabro na saúde", recebendo
apupos da bancada do PSD. Acrescentava então: "Poupou-se despesa no SNS,
mas não se pouparam vidas e isso não se pode desculpar a um Governo e que
"Poupou-se despesa no SNS, mas não se pouparam vidas e isso não se pode
desculpar a um Governo". Foi esta a intervenção da dirigente da extrema-esquerda
durante o debate quinzenal no parlamento: "Quero saber de que cortes na
despesa é que se orgulha, três dias antes de ter morrido uma pessoa sem
assistência no Hospital de Santa Maria, a diretora das urgências disse que não
tinha meios, nós temos pessoas a morrer nas urgências sem assistência".
Com o presente Governo socialista já demissionário e na
antecipação da campanha contra o PS o sinal dado pelos órgãos de comunicação as para
as criticas ao SNS, que já tinham sido iniciadas pelas ordens dos médicos e
sindicatos independentes, que também fazem política partidária, foram
reforçadas em junho do corrente por Passos Coelho que, segundo a TSF, numa
intervenção de mais de 50 minutos, acompanhada na primeira fila pelo candidato
à Câmara de Lisboa Carlos Moedas, Passos Coelho apontou
"um paradoxo" à esquerda no domínio da saúde em particular.
"Seria imperdoável que a esquerda, que diz ser que é
uma espécie de 'alma mater' do SNS o esteja a desqualificar desta
maneira e que seja a o que se chama de direita sempre a tentar salvar a
situação e ver se lhe consegue dar sustentabilidade". Criticava o que o
que chamou de "estatização" do SNS, que considera ter resultado
na falta de atração dos profissionais e na degradação de equipamentos e serviços
prestados.
Durante a apresentação do livro de um militante do PSD este afirmou
que Passos nunca cortou no SNS. E janeiro de 2021 no jornal Observador o dito
militante apresentou uma série de generalidades e medidas avulso como medidas tomadas
por Passos Coelho para melhorar o SNS que iam da “manipulação inteligente do
sistema informático” que “que pôs todos os médicos a receitaram por princípio
ativo genérico”, e na poupança em exames e medicamentos sem interesse clínico
efetivo, “alargou os horários dos médicos para 40 horas, aumentando assim a
oferta de mais horas médicas e poupando em horas extra, que pode ler aqui,
coisa que os médicos posteriormente contestaram. Recordo-me daquela altura em que
os médicos de família com receio reduziam os medicamentos e os exames aos
utentes ficando sem meios de diagnóstico eficazes como aconteceu comigo.
Recorde-se que em 2008, durante o Jornal Nacional da TVI, em
campanha para a liderança do PSD Manuela Ferreira Leite e Passos Coelho,
candidatos à liderança do PSD, declaravam-se a favor do fim do Serviço Nacional
de Saúde (SNS) tendencialmente gratuito para todos, defendendo que sirva quem
tem menos recursos e Passos reforçava então que "concordo com este
princípio de acabar com a universalidade na área da saúde e não só". Isto era
a proposta para um SNS para pobres e outro para ricos, isto é, o fim de um SNS
universal.
Tenho observado ao longo dos anos que os órgãos de
comunicação social serem mais condescendentes, muitas vezes por omissão, com as
falhas e os erros dos governos de direita e ávidos predadores sempre ao ataque quando
os governos são do Partido Socialista moldando de forma mais ou menos direta, a
perceção que cada um de nós tem da realidade em que se insere. Deste modo, os
jornalistas deixam de ser mediadores e transforma-se em contrapoder e em produtores
de opinião pública e a perceção com que ficamos pode ser uma armadilha lixada. Ainda
que os factos seguramente nos digam uma coisa, temos a capacidade de construir
sólidos argumentos excecionais para sustentar o contrário, se para isso formos
levados.
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